Nas cinco partes do longo poema A Terra Desolada (1922), do americano naturalizado inglês T. S. Eliot (1888-1965), encontra-se um sumário conciso da história do pensamento ocidental. Entre as vozes que se alternam, há constantes empréstimos à literatura europeia, à literatura indiana e à Antiguidade clássica.
Símbolo da civilização sem rumo do pós-Primeira Guerra, o poema contribuiu - ao longo de seus mais de 400 versos - para sedimentar as bases do modernismo (embora Eliot se afirmava como classicista).
Segundo críticos, o poema remete ao mito do Santo Graal das novelas de cavalaria medievais, à um país desolado e sáfaro, governado por um rei impotente, país no qual não apenas os animais de reproduzir-se, como os próprios habitantes humanos se tornaram incapazes de ter filhos. Mas logo identificamos tal esterilidade como a esterilidade do temperamento puritano.
O poema traduz o universo de infertilidade do pós guerra, onde os homens eram tomados por incertezas e se contentavam com prazeres medíocres e sórdidos.
O poema traz assuntos recorrentes, utilizando de justaposições entre o feio e o belo, o burlesco e o grandioso.
A Terra Desolada foi publicada inicialmente na revista Criterion, fundada e dirigida por Eliot. Consciente da complexidade da obra, ele elaboraria posteriormente sete páginas de explicações e referências, um mapa que acreditava ser importante para a compreensão de seu poema. Os versos foram consumidos com voracidade pelos escritores da época, causando profundo impacto principalmente no grupo da geração perdida de Gertrude Stein, Ernest Hemingway e Francis Scott Fitzgerald.
1- O enterro dos mortos
Abril é o mais cruel dos meses, germina
Lilases da terra morta, mistura
Memória e desejo, aviva
Agônicas raízes com a chuva da primavera.
O inverno nos agasalhava, envolvendo
A terra em neve deslembrada, nutrindo
Com secos tubérculos o que ainda restava de vida.
O verão; nos surpreendeu, caindo do Starnbergersee
Com um aguaceiro. Paramos junto aos pórticos
E ao sol caminhamos pelas aléias de Hofgarten,
Tomamos café, e por uma hora conversamos.
Big gar keine Russin, stamm' aus Litauen, echt deutsch.
Quando éramos crianças, na casa do arquiduque,
Meu primo, ele convidou-me a passear de trenó.
E eu tive medo. Disse-me ele, Maria,
Maria, agarra-te firme. E encosta abaixo deslizamos.
Nas montanhas, lá, onde livre te sentes.
Leio muito à noite, e viajo para o sul durante o inverno.
Que raízes são essas que se arraigam, que ramos se esgalham
Nessa imundície pedregosa? Filho do homem,
Não podes dizer, ou sequer estimas, porque apenas conheces
Um feixe de imagens fraturadas, batidas pelo sol,
E as árvores mortas já não mais te abrigam,
nem te consola o canto dos grilos,
E nenhum rumor de água a latejar na pedra seca. Apenas
Uma sombra medra sob esta rocha escarlate.
(Chega-te à sombra desta rocha escarlate),
E vou mostrar-te algo distinto
De tua sombra a caminhar atrás de ti quando amanhece
Ou de tua sombra vespertina ao teu encontro se elevando;
Vou revelar-te o que é o medo num punhado de pó.
Trecho de “Terra Desolada”, de T.S. Eliot.