A LUTA PELA RECORDAÇÃO - Pablo Neruda




Os meus pensamentos foram-se afastando de mim,
mas chegando a um caminho acolhedor,
repilo os tumultuosos pesares e detenho-me,
de olhos fechados,
enervado num aroma de afastamento que eu próprio fui conservando,
na minha pequena luta contra a vida.
Só vivi ontem...
Ele tem agora essa nudez à espera do que deseja,
selo provisório que nos vai envelhecendo sem amor!

Ontem é uma árvore de longas ramagens,
e estou estendido a sua sombra, recordando.
De súbito, contemplo surpreendido, longas caravanas de caminhantes,
que, chegados como eu a este caminho,
com olhos adormecidos na recordação,
entoam canções e recordam.
E algo me diz que mudaram para se deter,
que falaram para se calar,
que abriram os olhos atônitos
ante a festa das estrelas,
para fechar e recordar...

Estendido neste novo caminho,
com olhos ávidos florescidos de afastamento,
procuro em vão
interceptar o rio do tempo que tremula sobre as minhas atitudes.
Mas a água que consigo recolher,
fica aprisionada nos tanques ocultos do meu coração
em que amanhã terão de se submergir as minhas velhas mãos solitárias...

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